“Os procedimentos irregulares adotados pelo Incra na criação
e instalação dos assentamentos vêm promovendo a destruição da fauna, flora,
recursos hídricos e patrimônio genético, provocando danos irreversíveis ao
bioma da Amazônia”, dizem as ações iniciadas essa semana, resultado de investigação
conjunta que demorou um ano para ser concluída.
A participação do Incra no volume total de desmatamento da
região também vêm crescendo por conta da regularização ambiental da atividade
pecuária. Historicamente, a criação de gado em áreas particulares era o
principal vetor do desmatamento, mas dois anos depois dos acordos da carne
legal, iniciados no Pará, as derrubadas em assentamentos estão ficando mais
preocupantes. Elas representavam 18% do desmatamento em 2004, mas em 2010
atingiram um pico: somaram 31,1% de todo o desmatamento anual na Amazônia.
As ações relatam à Justiça Federal os danos em cada estado.
Em comum, em todos os processos o MPF pede a interrupção imediata do
desmatamento em áreas de reforma agrária, proibição de criação de novos
assentamentos sem licenciamento ambiental e um plano para licenciar os
assentamentos existentes, bem como para averbação de reserva legal e
recuperação de áreas degradadas, com prazos que vão de 90 dias a um ano.
As ações judiciais foram elaboradas pelo Grupo de Trabalho
da Amazônia Legal, que reúne procuradores da República de toda a região, e
ajuizadas em seis dos nove Estados que compõem a Amazônia Legal. Amapá e
Tocantins ficaram de fora por terem números inexpressivos de desmatamento nas
áreas de reforma agrária. O Maranhão, que tem uma das situações mais graves nos
assentamentos, está concluindo o inquérito sobre o assunto.
Cem metrópoles - A área já desmatada pelo Incra corresponde
a 20 anos de desmatamento se mantido o ritmo atual, de cerca de 6 mil km2 por
ano. De acordo com a investigação, até 2010 o Incra foi responsável por 133.644
quilômetros quadrados de desmatamento dentro dos 2163 projetos de assentamento
que existem na região amazônica.
Para se ter uma ideia do prejuízo, a área desmatada é cerca
de 100 vezes o tamanho da cidade inteira de São Paulo. Só no ano passado,
dentro de assentamentos já criados do Incra, foram perdidos 1 milhão e 668 mil
hectares em floresta (um hectare é o tamanho médio de um campo de futebol).
Entre 2000 e 2010, foram mais de 60 milhões de campos de futebol em florestas
que vieram ao chão.
O MPF fez um cálculo com base no valor comercial dos
produtos madeireiros e chegou a um valor total de R$ 38, 5 bilhões em danos
ambientais causados pelo Incra em toda a Amazônia. O valor corresponde ao que
foi desmatado entre 2000 e 2010 e calculado pelos valores mínimos do mercado.
Os números foram obtidos por três instituições distintas, a
pedido do MPF, em análise das fotos de satélite dos assentamentos. Ibama, Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
(Inpe) e Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) chegaram às
mesmas conclusões: o desmatamento está descontrolado nas áreas de reforma
agrária. “Temos então que os assentamentos instalados pelo Incra responderam por
18% dos desmatamentos verificados na Amazônia Legal nos últimos 10 anos”, dizem
os procuradores da República nas ações judiciais.
De acordo com o Imazon, os assentamentos mais desmatados
estão no Pará, Maranhão e Mato Grosso. São 764 assentamentos (287 no PA, 207 no
MA e 117 no MT) que juntos desmataram mais de 64 mil hectares até 2010. Para se
ter uma ideia do tamanho do prejuízo. Nesses locais, entre 75% e 100% da
cobertura vegetal foi derrubada ilegalmente, o que acrescenta a ausência da
reserva legal na lista de infrações ambientais do Incra. Na Amazônia, o Código
Florestal prevê reserva legal de 80% da cobertura vegetal, em propriedades
privadas e também nas áreas de reforma agrária.
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