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sexta-feira, 8 de maio de 2009

Saúde pública: só falta desligar o aparelho

Às duas da tarde, a neta ligou para o fone 192, do Serviço de Assistência Médica de Urgência (Samu): a avó dela não estava bem, tinha tido um ataque, espumava, revirava os olhos, respirava mal. A atendente indagou qual a idade da senhora e quando soube que era 62, debochou: “Isso não é nada, não, minha mãe tem mais idade que isso e continua trabalhando na roça”. A neta disse-lhe que isso a avó estava ruim e precisava de socorro, não de palpites e gracejos. A atendente desligou. A avó da garota estava no segundo derrame. Avisada no serviço, a mãe da jovem correu para casa e junto com familiares aguardou a chegada da ambulância. Tempos depois alguém ligou para o Samu e falou com a mesma atendente sobre a providência solicitada para o transporte da paciente. A servidora pública disse que não passara o pedido ao atendimento porque a moça que ligara primeiro “tinha sido muito ignorante” com ela. O Samu não foi. A senhora já em coma foi levada numa viatura comum para a Climec, onde um médico a examinou e aconselhou a remoção para a UTI do Hospital Municipal e alertou: se o Samu tivesse ido buscar a paciente, sua situação não estaria tão preocupante. Removida para o Hospital Municipal, onde não existe UTI, a paciente ficou horas aguardando que alguém da administração hospitalar a encaminhasse ao Hospital Regional, único a possuir a unidade de tratamento intensivo, e deu-se outro problema: diz um familiar que quem tinha autoridade para encaminhar a avó ao HR não estava no HM. Por outro lado, dos dez leitos na UTI do Regional, administrado pela Sespa e com atendimento feito pela terceirizada Pró-Saude, apenas três estavam desocupados, sendo dois deles reservados para doentes de fora de Marabá. Enquanto a avó aguardada cada vez pior no Hospital Municipal, foi preciso que alguém da família saísse para comprar um termômetro, que nem isso tinha ali. Alguém também ligou para os três celulares do secretário de Saúde e todos estavam fora de área. Lá fora, no meio da tarde de quinta-feira e da multidão que desde madrugada aguardava atenção médica, um funcionário da Susipe, a superintendência do sistema que gerencia a penitenciária agrícola, queixava-se impaciente de fome e preocupação. Chegara às sete e meia da manhã e até àquela hora não conseguira uma avaliação cirúrgica para detendo com hérnia grave, por falta de médico. “Estou desde ontem de plantão aqui e não somos atendidos”, desabafou. Foi então que seu interlocutor fez o comentário melancólico e mais perfeito para a situação da saúde em Marabá: “Se com vocês é assim, imagine se fosse um flagelado...”

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